Quando ela passou da idade da amamentação, aquela que por nós cuidou de amamentar a Cristo, nosso Deus, desde o nascimento, e tinha três anos de idade, seus santos pais levaram ao templo de Deus (cf. Proto-Evangelho 7, 2). E eles a dedicaram como uma oferenda a Deus, como fora prometido antes do seu nascimento, e ali a levaram com glória e honra, como convinha.
Muitas virgens entraram ao seu lado e a acompanharam com lâmpadas reluzentes, como o Rei e Profeta, o antepassado da Virgem Imaculada, previu e disse desde o começo: em sua companhia foram apresentadas virgens ao rei (Sl 44, 15); pois o Profeta disse isso, antes da Apresentação, acerca das virgens que vieram e a acompanharam.
E essa profecia deve ser entendida não apenas sobre elas, mas também sobre as almas virgens que mais tarde seguiram seu caminho, que ela chamava de amigas. E mesmo se todas elas forem imperfeitas quanto à amizade e à semelhança com ela, as almas dos santos são, porém, chamadas suas amigas pela graça e bondade do seu Filho, o Senhor, pois o mesmo Rei e Criador de tudo não considerava inadequado chamar seus irmãos de diletos e amigos.
Pois, na realidade, todas as almas dos justos, que por uma vida de pureza conseguem tornar-se mesmo seus amigos, se tornarão dignas da intercessão dela e, pela graça, serão trazidas ao seu Rei e Filho e introduzidas no Santo dos Santos celestial, onde, a exemplo de seu Filho que entrou como precursor por nós, segundo a palavra do Apóstolo Paulo (cf. Hb 9, 12), assim também a Santíssima Mãe do Senhor ingressou no lugar do repouso celestial antes de todos, e as outras almas dos santos são para lá conduzidas em seguida, por sua intercessão.
A profecia de Davi sobre a Mãe de Deus
Decerto que estou desejoso por descrever os últimos atos da Virgem divinamente adornada, mas minha mente não quer ignorar as palavras do abençoado Profeta Davi. Desse modo, recordemos um pouco mais do que foi dito e compreendamos a profecia que o glorioso rei e profeta fez acerca de sua bendita Rainha e Filha, a Mãe de Deus.
Pois no Salmo 44,11 fala ele primeiro do Rei e Filho dela, quando conta que o Espírito Santo deu a ele as imagens de sua glória: a dupla beleza de sua aparência (cf. Sl 44, 3–4), a efusão de graça de seus lábios (cf. Sl 44, 3), a excelência de sabedoria, a unção com júbilo (cf. Sl 44, 8), o armamento do poder, a curva do arco, o cingir da espada aos rins (cf. Sl 44, 5–6), a vara da providência e a vara do poder (cf. Sl 44, 7), que pressagiavam a forma de sua Encarnação, em que Ele verdadeiramente os convida à paz e à justiça, e sua completa vitória em tudo, seu triunfo e seu eterno reinado.
Não obstante, ele conclui tais belas profecias acerca de Nosso Senhor Jesus Cristo e, de imediato, também declara os ornamentos de sua Santa Mãe. E ainda que alguns tenham interpretado tais palavras como uma referência à Igreja, não há, porém, absolutamente nada que impeça de entendê-las como uma referência à Santa Theotokos. Pois as palavras ditas pelo Espírito Santo não devem ser compreendidas de um único modo, mas de muitos, pois são um tesouro de bens. Os Padres que interpretaram essas palavras com referência à Igreja falaram bem e, do mesmo modo, a interpretação da profecia como uma referência à Santa Theotokos é algo verídico e sem erro.
Vide, pois, com que beleza ele prediz não só a sua Apresentação no templo, mas também as outras excelências e belezas espirituais dela. A rainha estará à tua direita (Sl 44, 10). Essa declaração prediz a Apresentação dela no templo e a sua posição à direita do altar no Santo dos Santos, o que em verdade é considerado estar à direita de Deus.
Em seguida, conta ele o adorno das suas virtudes, quão belíssima era ela, e que se adornava com uma veste em tecido de ouro de muitas cores, e se vestia com ornamento diverso (Sl 44, 10). Pois ele disse tudo isso acerca do adorno espiritual dela: embora diga tecido de ouro, todas as suas virtudes multi cores são, porém, previstas, cada qual bela e magnífica.
Mas quando se somam umas às outras e se unem, como se reuniram na bendita alma da Virgem Imaculada, sua beleza superior torna-se ainda maior. É por isso que ele diz com ornamento diverso, isto é, adornada de boas obras e pensamentos piedosos, em perfeito acordo com a vontade de Deus, seu Salvador.
A beleza da Virgem Imaculada
Como a abóbada celeste que aparece nas nuvens é única em substância e nome, mas multicolorida e adornada na aparência, assim também a Virgem Imaculada foi, desde tenra idade, variadamente enfeitada com inefáveis adornos de virtude. E enquanto crescia em idade, o ornamento das suas virtudes crescia imenso. E é por isso que o Rei desejava a sua beleza (Sl 44, 12) e habitou dentro dela.
É, portanto, bom e muito conveniente trazer à mente a sucessão destas palavras. Muitas filhas obtiveram riquezas, espirituais ou materiais; muitas alcançaram poder. Mas tu as superaste, em natureza e conhecimento, e foste elevada acima de todas elas, pela divina graça e pelo nascimento sobrenatural em ti (Pr 31, 29).
Embora esses testemunhos das Escrituras tenham atrasado um pouco a narrativa de sua vida, foram mencionados bem e convenientemente para a sua glorificação e para proveito dos piedosos. Voltemos, porém, ao plano inicial do discurso, pois como é ela, de todos os modos, mais exaltada e glorificada do que todos os seres humanos, assim também a maneira e o comportamento de sua vida não tinham igual.
Ela foi abençoada por todos e era cheia de graça e, direi ainda mais, que era sumamente digna de todas as graças, inteligente com relação às imagens e às palavras, observadora das visões divinas, completamente distante da agitação, da ira e da bisbilhotice, bela de alma e de corpo, de estatura normal, repleta de toda excelência e de todas as boas ações.
Ela, no entanto, era assim santa por natureza e verdadeiramente virgem, a ponto de que nem o mínimo desejo de qualquer paixão que corrompesse a sua santidade espiritual jamais a tocou.
A bondade e compaixão de Maria
Mas mais do que todos, sua santa alma era cheia de benevolência e de compaixão, e assim era ela, mais do que todos, imitadora de seu bom e benévolo Filho, tendo uma mente serena e humilde, com grande abundância de virtude e excelência de graça.
Era ela realmente a Rainha exaltada acima de toda natureza, em palavras, ações e pensamentos, pois devia tornar-se a Mãe do verdadeiro Rei de todas as coisas, que, então, se fez pobre e foi humilhado por nosso bem até a morte e morte na cruz (Fl 2, 8).
Assim, ela, a bendita e gloriosa sempre Virgem, foi também pobre e humilde de espírito, segundo as benditas palavras do Senhor (cf. Mt 5, 3). Era obediente aos sacerdotes, serva respeitosa e respeitada por todos, pois era uma criança de divina graça e também a Mãe do Rei dos Anjos e da humanidade.
Assim, pois, depois da infância, o poder de Deus a cobriu com sua sombra e a adornou, espiritual e corporalmente, com todo ornamento de virtude, como com brincos de ouro e vestida em muitas cores (Sl 44, 14).
Com tal comportamento e tais qualidades, ela estava presente no templo de Deus verdadeiramente como uma oferenda divina, uma imagem espiritual, expressão eloquente terrível para os demônios e desejo dos anjos — mas direi mais sobre isso — maravilhosa e aterrorizante para os anjos, mas virtuosa e eleita pelo Pai, pelo Filho e pelo Espírito Santo.
Os profetas descreveram a Virgem Maria
Por essa razão, o Santo Davi e outros Profetas proclamavam-na desde o começo como a montanha de Deus, a fértil montanha, montanha sobre a qual aprouve a Deus habitar (Sl 67, 16–17), a cidade de Deus sobre a qual se dizem coisas gloriosas (Sl 86, 3), a arca da santidade e lugar de repouso do Senhor (Sl 131, 8) e a Sião que era agradável e onde Ele escolheu residir (Sl 131, 13), o trono de Deus e sua carruagem conduzida por milhares de potências angélicas com inefável esplendor (cf. Sl 67, 18), o jardim inviolado, a fonte viva (cf. Ct 4, 12–15), o livro selado (cf. Is 29, 11), acerca do qual todos os livros fazem predições, no qual está escrito o Verbo que não pode ser escrito, sem começo e sem fim, o leito do rei com sessenta homens fortes ao redor (cf. Ct 3, 7), que são as palavras proféticas de suas Santas Escrituras, o candelabro de ouro, o cetro real que floresceu em beleza, a urna que carrega o maná divino, a mesa do pão da vida, as tábuas da verdadeira Lei, a arca coberta de ouro por todos os lados (cf. Hb 9, 2–4) pela graça do Espírito Santo, que abarcava o inabarcável conquistador de todas as criaturas.
E era assim, com tal conduta e tais qualidades agradáveis a Deus, que a Santíssima Virgem se fazia presente no templo e crescia em estatura e virtude para além do que pode ser compreendido.
O mistério da infância da Virgem
Quem poderia descrever em pormenor seus serviços, preces e ornamentos de toda boa obra, os quais ela manifestou em tenra idade? Porque, como todas as suas ações estavam além da compreensão, assim também toda a sua vida foi exaltada para além da natureza, de modo proporcionado à sua condição de tornar-se a Rainha de todas as coisas e a Mãe do Senhor e Rei de todas as coisas; por ter sido escolhida pelo Pai e sido preparada pelo Espírito Santo para trazer em seu ventre o Filho Unigênito e Verbo de Deus, deles inseparável; e para tornar-se a causa da sua Encarnação e a sua residência entre os seres humanos.
Assim, pois, como digo, mesmo que seja imenso e impossível descrever exaustivamente todas as gloriosas obras e os feitos divinos que ela realizou durante a infância no templo, mencionarei aquele que é o maior de todos, o dom de seus muitos ministérios e petições.
Veja também: Joaquim e Ana: Os pais da Virgem Maria e o milagre da concepção
A anunciação e o mistério divino
Depois de breve tempo, quando ela se aproximava dos doze anos, houve um precursor e pressagiador de sua Anunciação.
Ela se ornava de toda sabedoria e de toda virtude, com jejuns e preces, com humildade e quietude, com temor e amor a Deus. Certo dia, à meia-noite, ela estava de pé bem à frente das portas do santuário, oferecendo preces e súplicas a Deus com um coração misericordioso e santo.
Então — eis um grande acontecimento e tremendo de se ouvir — resplandeceu uma luz intensa no templo, tão brilhante que, perto de sua luz, o sol visível se fez pequeno e escuro. E ela ouviu uma voz vinda do santuário, que dizia: “Maria, de ti nascerá o meu Filho”.
Quando a Santa Maria ouviu isso, não se assustou, nem se amedrontou por causa de sua juventude, nem se tornou orgulhosa de uma alegria excessiva, e não contou o fato a mais ninguém, tampouco ocorreu nela qualquer mudança de comportamento ou pensamento; mas espantou-se com aquelas palavras, como convinha.
No entanto, ela escondeu no coração esse mistério realmente grandioso, que foi ordenado antes dos séculos e desconhecido mesmo dos anjos, até que ela viu se cumprirem nela mesma os mistérios providenciais, quando Cristo, o Rei, dela nasceu, e ela consumou a divina economia da sua vida entre os homens, e Ele ressuscitou dos mortos e ascendeu ao céu.
O louvor e a glória, a exaltação e a honra de nossa santíssima, incorruptível e toda abençoada Rainha, a Theotokos e sempre Virgem Maria, e a história de sua imaculada e abençoada vida, do nascimento até a Dormição, escrita por nosso bendito Padre Máximo, filósofo e confessor.
Trechos retirado do livro A vida da Virgem – Capítulo I.
De São Máximo Confessor.
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